Quinta do Saldanha

Texto publicado na "Revista Occidente" de 11 de Agosto de 1885

Monumento da fé na Quinta do Marechal Saldanha em Cintra

Na estrada vulgarmente conhecida por estrada da Sabuga, em rasão de n’este caminho se encontrar a fonte da deliciosa agua da Sabuga, corre parallelo á estrada a quinta do Duque de Saldanha, cujo portão ou entrada principal é á esquerda da referida fonte. Esta quinta teve os seus dias aureos, a sua epocha brilhante. Era o ponto de reunião aristocrático, dos que estacionavam em Cintra na estação calmosa, alli iam attraidos pela nunca desmentida bizarria, do marechal que era ao mesmo tempo o primeiro fidalgo portuguez na galanteria e na magnificencia das suas acções, repartindo, dando e dispendendo com grandeza d’animo nunca excedida, todas as suas rendas e proventos.

Magnificas festas se deram então n’aquella quinta que hoje esta quasi abandonada, e pouco resta das grandezas de outr’ora. Ainda assim não é das menos visitadas pelos forasteiros, e para isso lhe basta a sua posição accidentada, permittindo de alguns de seus pontos elevados o desfructarem-se bellos panoramas, quanto a vista possa abranger até se perder no oceano atlântico.
É precisamente n’um desses pontos d’onde se avistam mais dilatados horisontes, que se ergue o monumento que reproduzimos em gravura, copia de um desenho do album do proprietario e director artistico do Occidente, Caetano Alberto.
O monumento está assente na parte do jardim que cerca o palacio e no sitio mais espaçoso d’esse jardim. É de um estylo funebre e tanto, que á primeira vista parece um mausuléu, principalmente se atendermos á figura da Fé que o domina.
Foi mandado fazer pelo Marechal Duque de Saldanha, que lhe mandou gravar a seguinte inscripção em dois escudos eguaes collocados no atico do monumento do lado norte e sul:

O AMOR DE DEUS
DO QUAL NASCE
O AMOR DA FAMILIA
DO QUAL DERIVA
O AMOR DA PÁTRIA
HE SÓ
O QUE PODE ASSEGURAR-NOS
A FELICIDADE NA TERRA
NO CEU A BEM AVENTURANÇA

"Em rasão deste caminho se encontrar a fonte da deliciosa agua da Sabuga..."

O Marechal Duque de Saldanha D’este modo quiz affirmar o nobre Duque, bem publicamente a sua fé christã, deixando um monumento da sua crença ás gerações futuras. O valente general procurou na religião as consolações, que tantas victorias ganhas já lhe não podiam dar, nos longicuos echos da ovações de vinte annos passados , e assim se foi deixando resvalar para o tumulo, que a grande arvore da liberdade, por elle plantada já assombreada e em torno do qual já vicejavam os louros que lhe haviam de cobrir a sepultura.

"Revista Occidente", de 11 de Agosto de 1885

*Ortografia e pontuação conforme o original

Comentários

Rui Silva disse…
Pedro, que crime a forma como pintara a Fonte da Sabuga...
RVS
Anónimo disse…
Em 1885 estava "quasi abandonada" e, neste momento, estão, quinta e edifício,completamente abandonados. Um dos vários exemplares existentes em pleno Centro Histórico de Sintra.
Ao que consta são, edifício e quinta, propriedade do Patriarcado de Lisboa.
ereis
pedro macieira disse…
Rui,
Vou nos próximos dias postar sobre a Fonte da Sabuga, razão porque não escrevi nada no post da Quinta do saldanha.
Um abraço
pedro macieira disse…
ereis,
Também achei curioso, a frase de que em 1885 estava "quasi abandonada" 124 anos depois...
O aspecto actual não é agradável, e aquele portão verde ondulado, não ajuda muito ao aspecto abandonado que o palácio tem.A vista que se tem da estrada já quase só ao nível do telhado.
Um abraço
Anónimo disse…
O problema de muito do património sintrense é que pertence a particulares ou instituições que não têm dinheiro ou vontade de os recuperar. Quando a CMS tenta adquirir são pedidos preços proibitivos.
Quantro à fonte da sabuga. Era assim na sua origem.
Anónimo disse…
Ou a CMS compra e deixa, como fazem os particulares, o património ao abandono. Para já não falar da Quinta de Ribafria, vêja-se o que está a acontecer à Quinta da Amizade, também no coração do Centro Histórico, cujo edifício e jardins da autoria de Luigi Manini foram mandados construir, em finais do sec. XIX por Victor Sassetti. A Câmara adquiriu a propriedade em Janeiro de 2004 e não se lhe conhece, até ao presente, qualquer destino.
Valha-nos, ao menos, que promoveu a publicação, na Revista "Vária Escrita" Nº.11 de 2004, de
um interessante artigo sob o título "A Vila Sassetti, Projecto do Cenógrafo-Arquitecto Luigi Manini", da autoria de Denise Pereira e Gerald Luckhurst".
ereis

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