Cintra elegante
Visão da Revista Brasil Portugal sobre a “Cintra Elegante” em 1912
A Vida Elegante
Quando os Estoris ainda não desdobravam ao longo da costa, esse alacre tapete de verdejantes de pinhaes matisados de habitações polychromas que dão ao litoral n’aquelle o ar coquette de estranjeirado acampamento de prazer, quando apenas Cascaes, desde Lisboa, podia orgulhar-se de guardar em Setembro e Outubro a tradição de refugio elegante e movimentado da côrte e respectivos satellites, já Cintra era a estancia formosissima que attrahia veraneante e touristes, - deslumbrando o olhar com delicada exuberancia da sua vegetação com o discreto colorido e risonhos aspectos da sua paizagem, era já estação verdadeiramente elegante, preferida durante os mezes de temporada estival, pelo alto mundo da aristocracia e da finança.
N’esse tempo um passeio á linda villa, com desvio obrigatório d’uma burricada á Pena, ou a Collares – e a carga no regresso de alguns pacotes de queijadas da Sapa e de alguns mólhos de rendilhados fétos arrancados ás braçadas humidas das arvores e aos interstícios das pedras musgosas das fontes era caso de tamanha ponderação pelo que representava em desiquilibrio nos orçamentos caseiros, que Cintra estava para o appetite de certas familias, como alguns oasis que as caravanas extenuadas avistam ao longe, pressentido-lhe a dôce , a reconfertante frescura , mas sem forças para a alcançar.
(...)
-Assaltada a meudo pela multidão dos cirios civis em festa que se espraia ruidosa nos mais pitorescos recessos, tudo despoetisando ao som bravio de fungagás inverosimeis. Então dizer, Cintra, era dizer Setiais onde mundanismo da época se dava o rendez-vous tranquillamente ás quatro horas, era dizer o Victor, o elegante Hotel de Victor Sasseti, em cujo terraço se juntavam para a mais suggestiva e espirituosa palestra, nas horas calmas que succediam ao jantar, grupos de mundanos e intellectuaes , onde officiavam a meudo Ramalho Ortigão, Eça de Queiróz, Julio Cesar Machado e outros sacerdotes das lettras e da elegancia, que não se desdenhavam de accumular as galas das toillete e das louçanias do estylo facetado e brilhante.
(...)
Hoje Cintra, ainda é um refugio aristocrático e elegante; mas, a sua vida mundana restringe-se, encerra-se nos jardins das lindas quintas de recreio, fechadas definitivamente á curiosidade pública, concentra-se em meia duzia de casas nobres, que são como marcos indicadores de d’um Passado brilhante, cuja evocação determina dolorosas recordações....
Texto de Luiz Trigueiros fotos de Eduardo da Maya Cardoso
Revista Brasil Portugal Nº331 de 1 de Novembro de 1912
*Ortografia e pontuação conforme texto original
A Vida Elegante
Quando os Estoris ainda não desdobravam ao longo da costa, esse alacre tapete de verdejantes de pinhaes matisados de habitações polychromas que dão ao litoral n’aquelle o ar coquette de estranjeirado acampamento de prazer, quando apenas Cascaes, desde Lisboa, podia orgulhar-se de guardar em Setembro e Outubro a tradição de refugio elegante e movimentado da côrte e respectivos satellites, já Cintra era a estancia formosissima que attrahia veraneante e touristes, - deslumbrando o olhar com delicada exuberancia da sua vegetação com o discreto colorido e risonhos aspectos da sua paizagem, era já estação verdadeiramente elegante, preferida durante os mezes de temporada estival, pelo alto mundo da aristocracia e da finança.
N’esse tempo um passeio á linda villa, com desvio obrigatório d’uma burricada á Pena, ou a Collares – e a carga no regresso de alguns pacotes de queijadas da Sapa e de alguns mólhos de rendilhados fétos arrancados ás braçadas humidas das arvores e aos interstícios das pedras musgosas das fontes era caso de tamanha ponderação pelo que representava em desiquilibrio nos orçamentos caseiros, que Cintra estava para o appetite de certas familias, como alguns oasis que as caravanas extenuadas avistam ao longe, pressentido-lhe a dôce , a reconfertante frescura , mas sem forças para a alcançar.
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-Assaltada a meudo pela multidão dos cirios civis em festa que se espraia ruidosa nos mais pitorescos recessos, tudo despoetisando ao som bravio de fungagás inverosimeis. Então dizer, Cintra, era dizer Setiais onde mundanismo da época se dava o rendez-vous tranquillamente ás quatro horas, era dizer o Victor, o elegante Hotel de Victor Sasseti, em cujo terraço se juntavam para a mais suggestiva e espirituosa palestra, nas horas calmas que succediam ao jantar, grupos de mundanos e intellectuaes , onde officiavam a meudo Ramalho Ortigão, Eça de Queiróz, Julio Cesar Machado e outros sacerdotes das lettras e da elegancia, que não se desdenhavam de accumular as galas das toillete e das louçanias do estylo facetado e brilhante.
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Hoje Cintra, ainda é um refugio aristocrático e elegante; mas, a sua vida mundana restringe-se, encerra-se nos jardins das lindas quintas de recreio, fechadas definitivamente á curiosidade pública, concentra-se em meia duzia de casas nobres, que são como marcos indicadores de d’um Passado brilhante, cuja evocação determina dolorosas recordações....
Texto de Luiz Trigueiros fotos de Eduardo da Maya Cardoso
Revista Brasil Portugal Nº331 de 1 de Novembro de 1912
*Ortografia e pontuação conforme texto original
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