A Proclamação da República

A saída do Rei

Na tarde de 4, logo que começou o bombardeamento do Paço das Necessidades, o Rei D. Manuel foi tomado de um profundo pavor, perdendo toda a coragem, e resolvendo logo fugir de Lisboa. Então um automóvel o conduziu ao palácio real de Mafra, acompanhando-o o Marquês do Faial e o Conde de Sabugosa. A Rainha D.Amélia, que estava em Sintra, para ali se dirigiu nessa mesma tarde. Na manhã seguinte chegou também áquela vila a Rainha D. Maria Pia.

Depois de uma noite angustiosa, como foi a de 4 para 5, as noticias recebidas de Lisboa e transmitidas ás pessoas reais lançaram-nas em um abatimento quasi inconsciente. Assim estiveram, tomadas de indecisão, até ás duas da tarde, hora em que o administrador do concelho de Mafra recebeu ordem telegráfica do novo governo para hastear a bandeira da República.


A familia Real partindo da Praia da Ericeira para o exilio em 5 de Outubro de 1910,é aguardada pelo yacht “Amélia”-desenho de J.Ribeiro Christin
Ao mesmo tempo que isto se passava, telegrafavam da Ericeira estar á vista o yacht Amélia, e foi então que se decidiu a fuga a bordo daquele barco.
(...)
Chegados á praia em frente da qual pairava o yacht, que não chegara a lançar ferro, e se conservava sobre pressão, apearam-se os foragidos, trepando ao forte, donde depois desceram à praia. Duas barcas de pesca os conduziram a bordo do Amélia, tornando-se o embarque dificil por causa da agitação do mar.
(...)
O Amélia fez-se ao largo com presteza, mas pairou depois à vista da Ericeira até perto da meia-noite. A essa hora, do lado do Cabo da Roca foi visto fazer por meio de um farol um sinal de luz amarela, afastando-se então o yacht seguindo rumo ao Norte.

Depois se soube que foi ter a Gibraltar, onde desembarcou os desditosos passageiros da sua ultima viagem real.

Publicado na Revista“Occidente“ de 20 de Outubro de 1910

Comentários

José Cavalheiro disse…
Boa noite
Obrigado pela lição de história sobre a fuga dos últimos reis de portugal
Já comprei uma rifa para a feata de almoçageme.
Gostei tembém de saber que continuas a escrever sobre a tua terra

Fica bem
pedro macieira disse…
José Carvalheiro,
Obrigado pela visita.
Um abraço
Anónimo disse…
Caro Pedro:

Independentemente das convicções de cada um, a 1ª república começou com um acto vergonhoso - um regicídio - e continuou, dois anos depois com disparates sobre disparates, crimes sobre crimes (basta lembrar o «camião da morte»). A peça jornalística tenta manchar a honra de D. Manuel II, que nunca foi cobarde, e cuja «fuga» lhe foi imposta. Mesmo assim, a sinistra Carbonária viria a assassiná-lo em Londres em 1932 com vitríolo (o corpo do Rei começou a desfazer-se poucas horas depois da morte).

Na realidade, o regime republicano assenta no sangue, e não em qualquer plebiscito, e tem servido para aplicação de agendas mais ou menos sinistras, impostas de fora. O resultado - infelicíssimo - está à vista.

O que teria acontecido a Portugal caso a Monarquia continuasse a vigorar? Seria uma bela ficção histórica...

Enfim, Caro Pedro, não o quero melindrar nesta Sua excelente Casa, mas prefiro lembrar o outro 5 de Outubro, o de 1143, e não o carbonário de 1910.

Abraço.
pedro macieira disse…
Caro Carlos Portugal,
Agradeço a sua visita e o interessante comentário.
Quanto à peça jornalistica que transcrevi parcialmente, sobre a fuga da familia real, ela foi publicada quinze dias após o 5 de Outubro de 1910, numa revista que até 15 dias antes sob o regime monárquico era uma voz importante na comunicação da época, mesmo com as dificuldades censórias que o regime impunha. Na minha opinião o jornalista/testemunha descreve com alguma realidade o ambiente vivido na altura pela familia real, naquela tumultuosa fuga.

Considero também que qualquer alteração de uma sociedade, tem na sua essência algumas razões profundas, e na altura das convulsões sociais ,cometem-se actos/erros que mais tarde só história permite análisar, dando-nos uma visão dos acontecimentos que na altura não era possivel ter.
Um abraço

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