Plátanos de Colares
Enviado por Paulo Ferrero, do blogue "Cidadania de Cascais", publicamos um excelente texto/apelo, em defesa dos Plátanos de Colares:
Hesitei em dar voz ao apelo pungente que me chegou há dias, não tanto pela vera importância da questão em apreço, que o é deveras, mas pelo remetente ser um exemplar vulgar de Lineu a que os bons dos romanos decidiram chamar «platanus». Omitindo o intróito desnecessariamente cerimonioso, passo a citar o essencial da missiva recebida em jeito de abdicação:
«Falo-lhe na qualidade de marcado para a morte ou, pelo menos, de rolado, que é como quem diz decepado de uma copa com mais de 60 anos. Fui marcado a tinta encarnada porque as minhas belas e vetustas hastes estorvam a passagem de veículos, pondo em risco pessoas e bens. Parece que um Sr. que conduzia um TIR a alta velocidade em pleno centro de Colares, raspou o cocuruto do camião pela ramagem de um dos meus parentes defronte à Adega Cooperativa desta vila, que faz parte de Sintra, Património da Humanidade. O contentor ameaçou cair e o queixume chegou aos senhores da entidade que tutela as estradas nacionais deste país. As Estradas de Portugal resolveram cortar o mal pela raiz e abater dezenas de plátanos como eu, sustentando-se em douto parecer que aponta, calcule, para um débil estado fitossanitário de nós todos, plátanos da estrada que liga Sintra a Colares, que aguentamos com todas as agressões há décadas e décadas.
Valeram, ou têm valido, muitos humanos desta região, e não só, que têm feito chegar a sua revolta a Junta de Colares, Câmara Municipal de Sintra e Autoridade Florestal Nacional, pedindo-lhes encarecidamente para convencerem as E.P. a repensar o assunto. Até querem classificar-me. Está em causa, dizem (acredito), um património arbóreo invulgarmente belo, património que é de todos (portanto, da Humanidade), «ex-libris» da zona, mais importante que estradas esburacadas e mal desenhadas. Mas fui informado que a minha esplendorosa sobrevivência, e a dos meus irmãos, primos e demais familiares, está longe de estar garantida, uma vez que apenas está suspensa a empreitada até prova em contrário: até que alguma sumidade emita parecer em que, preto no branco, esteja “estas árvores estão a perder seiva, estão ocas, com ramadas que foram crescendo anarquicamente, hoje ameaçando efectivamente pessoas e bens, e, portanto, estas árvores precisam de ser desbastadas, roladas, ou até abatidas”.
Sinto-me profundamente triste com esta Humanidade. Gostava de ser um «Ent», um daqueles fabulosos seres, meio homens, meio árvores, que J.R.R. Tolkien imortalizou na sua saga literária; para poder fugir rumo a França, onde apesar de rolarem muitos dos meus, nunca me tratariam como as E.P; ou para Berlim, onde chegam a vingar, viçosas e impressionantes, quatro fileiras paralelas de plátanos nas suas avenidas. Mas não sou. Como tal, estou pronto para morrer de pé.». Pungente, na realidade.
In Jornal de Notícias (12/8/2010)
Post relacionado:
Texto de Maria João, do Blogue "PortoCroft" - Aqui
Hesitei em dar voz ao apelo pungente que me chegou há dias, não tanto pela vera importância da questão em apreço, que o é deveras, mas pelo remetente ser um exemplar vulgar de Lineu a que os bons dos romanos decidiram chamar «platanus». Omitindo o intróito desnecessariamente cerimonioso, passo a citar o essencial da missiva recebida em jeito de abdicação:
«Falo-lhe na qualidade de marcado para a morte ou, pelo menos, de rolado, que é como quem diz decepado de uma copa com mais de 60 anos. Fui marcado a tinta encarnada porque as minhas belas e vetustas hastes estorvam a passagem de veículos, pondo em risco pessoas e bens. Parece que um Sr. que conduzia um TIR a alta velocidade em pleno centro de Colares, raspou o cocuruto do camião pela ramagem de um dos meus parentes defronte à Adega Cooperativa desta vila, que faz parte de Sintra, Património da Humanidade. O contentor ameaçou cair e o queixume chegou aos senhores da entidade que tutela as estradas nacionais deste país. As Estradas de Portugal resolveram cortar o mal pela raiz e abater dezenas de plátanos como eu, sustentando-se em douto parecer que aponta, calcule, para um débil estado fitossanitário de nós todos, plátanos da estrada que liga Sintra a Colares, que aguentamos com todas as agressões há décadas e décadas.
Valeram, ou têm valido, muitos humanos desta região, e não só, que têm feito chegar a sua revolta a Junta de Colares, Câmara Municipal de Sintra e Autoridade Florestal Nacional, pedindo-lhes encarecidamente para convencerem as E.P. a repensar o assunto. Até querem classificar-me. Está em causa, dizem (acredito), um património arbóreo invulgarmente belo, património que é de todos (portanto, da Humanidade), «ex-libris» da zona, mais importante que estradas esburacadas e mal desenhadas. Mas fui informado que a minha esplendorosa sobrevivência, e a dos meus irmãos, primos e demais familiares, está longe de estar garantida, uma vez que apenas está suspensa a empreitada até prova em contrário: até que alguma sumidade emita parecer em que, preto no branco, esteja “estas árvores estão a perder seiva, estão ocas, com ramadas que foram crescendo anarquicamente, hoje ameaçando efectivamente pessoas e bens, e, portanto, estas árvores precisam de ser desbastadas, roladas, ou até abatidas”.
Sinto-me profundamente triste com esta Humanidade. Gostava de ser um «Ent», um daqueles fabulosos seres, meio homens, meio árvores, que J.R.R. Tolkien imortalizou na sua saga literária; para poder fugir rumo a França, onde apesar de rolarem muitos dos meus, nunca me tratariam como as E.P; ou para Berlim, onde chegam a vingar, viçosas e impressionantes, quatro fileiras paralelas de plátanos nas suas avenidas. Mas não sou. Como tal, estou pronto para morrer de pé.». Pungente, na realidade.
In Jornal de Notícias (12/8/2010)
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Texto de Maria João, do Blogue "PortoCroft" - Aqui
Comentários
Julgo e como não há certezas...para já esses plátanos não serão decepados para já e graças ao que o texto refere e tu Pedro és um dos mentores ao teres lançado a petição em defesa das árvores de Sintra.
Um abraço
Obrigado pelo comentário. A paragem da intervenção programada nos Plátanos de Colares, e o seu processo de análise para classificação, é tudo de que temos a certeza.Esperemos que este movimento público que foi gerado em torno dos Plátanos de Colares continue activo e atento aos próximos acontecimentos.
Um abraço
Obrigada a quem se opôs e conseguiu, pelo menos, adiar essa decisão, absolutamente insana!
Bem haja a quem teve a iniciativa de as defender
Obrigado pelo comentário.Será´necessário que continuemos atentos sobre o que se irá passar com os Plátanos de Colares, porque a ideia de uma intervenção naquele grupo de Plátanos não está de todo afastada, embora esteja em análise o processo da sua classificação.
Abraço